Os cosméticos de marcas internacionais (como Eucerin, La Roche-Posay, Cerave, etc) são iguais no mundo todo? O cosmético que eu compro no Brasil, é o mesmo que vende na Europa ou nos Estados Unidos? Para me ajudar a responder essas questões, eu conversei com a Daniela, especialista no assunto:
Índice
- Você poderia contar um pouquinho sobre você e com o que trabalha?
- Já que vamos falar sobre legislações cosméticas, por que não começar pelo Brasil? Você pode falar um pouco sobre que orgão regula e fiscaliza cosméticos no Brasil? Ao que devemos estar atentas na hora de adquirir um cosmético?
- No que os orgãos reguladores se baseiam para decidir se um cosmético é adequado ou não? Que tipo de testes ou regulamentos o produto deve passar para que possa ser comercializado?
- Sobre produtos de marcas globais (por exemplo La Roche-Posay, Eucerin, Cerave…): os produtos são iguais em todos os países que são comercializados?
- O fato dos produtos não serem iguais significa que produtos de alguns países (mesmo tendo o mesmo nome/rótulo) são melhores que em outros?
- Em termos globais, você acredita que a legislação cosmética brasileira está mais atrasada ou avançada que em outros países? Por quê?
Você poderia contar um pouquinho sobre você e com o que trabalha?
Olá! Eu sou a Daniela. Tenho 33 anos e moro em São Paulo/SP. Sou formada em engenharia química pela Universidade Federal do Paraná. Trabalho na área de Assuntos Regulatórios desde que me formei há 8 anos, sendo a 6 na área de cosméticos.
Já que vamos falar sobre legislações cosméticas, por que não começar pelo Brasil? Você pode falar um pouco sobre que orgão regula e fiscaliza cosméticos no Brasil? Ao que devemos estar atentas na hora de adquirir um cosmético?
Perfeito!
O órgão regulador de cosméticos (tanto de marcas brasileiras quanto de marcas de cosméticos internacionais) do Brasil é a Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. É um órgão regulador muito competente e de confiança. As legislações cosméticas no Brasil são baseadas principalmente na legislação Europeia, porém com um certo delay. Após algum tempo que temos publicações na Europa, essas decisões são incorporadas no Brasil.
A principal legislação de cosméticos hoje no Brasil é a RDC 752/2022, que define Produtos e Higiene pessoal, Cosméticos e Perfume. São preparações constituídas por substâncias naturais ou sintéticas, de uso externo nas diversas partes do corpo humano, pele, sistema capilar, unhas, lábios, órgãos genitais externos, dentes e membranas mucosas da cavidade oral, com o objetivo exclusivo ou principal de limpá-los, perfumá-los, alterar sua aparência e ou corrigir odores corporais e ou protegê-los ou mantê-los em bom estado. Ou seja, um cosmético não pode atuar ‘de dentro para fora’ como algumas marcas parecem querer dizer, não podem curar nenhuma doença (nem mesmo a acne – o papel dos cosméticos é melhorar a aparência). Por isso, para casos mais sérios, é importante procurar por medicamentos apropriados.
O consumidor deve estar atento no momento de comprar um cosmético se ele é registrado na Anvisa. Para isso, deve buscar na embalagem um código de 20 caracteres que sempre começa com “25351”. Geralmente fica no verso do produto junto com outras informações. Esse é o número de registro ou número do processo do produto. Devemos atentar também se o produto tem identificação de lote e validade, que são informações obrigatórias.
No que os orgãos reguladores se baseiam para decidir se um cosmético é adequado ou não? Que tipo de testes ou regulamentos o produto deve passar para que possa ser comercializado?
Primeiramente, o produto precisa estar enquadrado no contexto cosmético. A classificação dos cosméticos tem sido cada vez mais desafiada pelas marcas – vários deles tem alegações do que seriam produtos para saúde ou até mesmo medicamentos. A fiscalização no Brasil para esses produtos não é grande quanto na Europa, onde as marcas respeitam muito mais o que é definido em legislação.
As empresas devem testar seus produtos quanto à segurança, eficácia de todas as alegações (claims) e estabilidade do produto. Essas comprovações são exigidas no momento do registro do produto junto à Anvisa. A Anvisa determina como a maior parte dos testes deve ser conduzido também.
Os órgãos reguladores de grandes nações/continentes se baseiam em estudos científicos e pareceres de segurança, para entender quais matérias-primas têm indícios de causarem algum mal estar na população ou no meio ambiente. Também definem as listas de restrição de concentração e negativa (matérias-primas que não podem ser utilizadas em cosméticos).
Os países menores geralmente ‘copiam’ parte ou integralmente as legislações dos maiores. Alguns países não tem legislação cosmética, ou seja, qualquer cosmético pode ser comercializado livremente sem praticamente nenhum requisito. É o caso de alguns países africanos, como a Guyana e o Suriname.
Sobre produtos de marcas globais (por exemplo La Roche-Posay, Eucerin, Cerave…): os produtos são iguais em todos os países que são comercializados?
Os cosméticos internacionais podem ser iguais ou diferentes dependendo da composição ou alegações (claims). Alguns países têm diferentes listas restritivas de concentração de matérias primas ou mesmo negativas (que não podem ser utilizadas), o que pode afetar a possibilidade de exatamente o mesmo produto ser comercializado.
Algumas categorias de produtos podem ser consideradas cosméticos no Brasil e terem outra classificação em outros países e portanto outras exigências de comercialização. Um exemplo são os protetores solares que são cosméticos no Brasil, porém são OTC nos EUA (Over The Counter – uma classificação entre cosméticos e medicamentos que não existe no Brasil). Uma regularização diferenciada precisa ser respeitada para comercializar protetores solares nos EUA. Inclusive, um ponto para protetores solares nos EUA – eles tem uma legislação um pouco mais antiga para esses itens e a lista de filtros solares permitidos por lá não foi atualizada. Vários especialistas entendem que a composição de um protetor solar dos EUA não se adequa a exposições solares prolongadas.
Em alguns casos, algumas alegações podem ser proibidas em alguns países também, o que pode parecer que o produto é diferente, mas algumas vezes não é. Por exemplo, na Europa não é permitido que se degrina a imagem de marcas concorrentes, desde que elas estejam de acordo com as legislações. Por exemplo, não se pode alegar que um produto não contém algum ingrediente que é permitido só por que está na mídia que ele não é interessante – por exemplo os parabenos (apenas os de cadeia curta são proibidos). Na Europa também é levado mais a sério as limitações da categoria cosmética e dificilmente será encontrado produtos que aleguem ser “milagrosos “ como pode ocorrer no Brasil, por ter mais fiscalização. Algumas vezes a fórmula é a mesma, mas a rotulagem precisa ser diferente para se adequar. Para isso vale comparar a lista de ingredientes dos produtos.
De uma forma geral, grandes marcas produzem produtos que são compliant com todos os países que comercializam, portanto eles acabam sendo mais restritivos em suas composições para atender os países ‘mais exigentes’. É um custo grande para a empresa criar uma fórmula e rotulagem para cada país. Geralmente eles só adequam a rotulagem, quando necessário.
O fato dos produtos não serem iguais significa que produtos de alguns países (mesmo tendo o mesmo nome/rótulo) são melhores que em outros?
Depende da legislação cosmética dos países e até da idoneidade da empresa.
Por exemplo, se um país limita a concentração de um determinado ativo e outro país não limita, é possível que o do país que não limita seja mais concentrado naquele ativo. Entretanto, as limitações de concentração nas legislações geralmente são no intuito de proteger o consumidor de algum risco que determinada matéria prima pode incorrer ou mesmo que o consumidor seja enganado.
Um ótimo exemplo é a Vitamina C, em que a Anvisa exige que um teste de doseamento seja feito pelo fabricante para garantir a concentração no produto final até o último dia da validade do produto, já que é uma matéria prima que se decompõe com facilidade. Esse é o tipo de produto que é bom comprar de marcas conhecidas.
Dessa forma a Anvisa protege o consumidor de ser enganado. Se outro país não exigir isso, pode estar comprando um produto com a concentração menor do que comprou.
Em termos globais, você acredita que a legislação cosmética brasileira está mais atrasada ou avançada que em outros países? Por quê?
Em relação à Europa, eu acredito que sim, pois o Brasil copia muitas questões que são da legislação Européia. Com alguns anos de delay, mas copia. Então de certa forma estamos cobertos da parte mais crítica de segurança e eficácia.
Em relação aos EUA, em partes estamos melhores como no caso de protetores solares e em partes nem tanto. Nos EUA existe legislação cosmética por Estado, então depende disso também.
Não tenho conhecimento do mercado Coreano que está bem em alta com os cosméticos. Na China exigem testes em animais para liberar a comercialização de cosméticos. Os árabes têm questões com ingredientes suínos de uma forma geral e copiam a legislação europeia.
A maior parte dos demais países copiam as legislações da Europa e EUA em maior ou menor medida. E existem aqueles sem nenhuma legislação, que seriam os casos mais críticos.
O importante é procurar sempre por marcas idôneas e mais reconhecidas no mercado ou então que você tenha certeza que eles cumprem com a legislação, uma vez que a fiscalização no Brasil é muito baixa e muitas empresas prometem cura ou renovação de dentro pra fora, que sabemos que não podem provar.
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